quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

A Defesa do Poeta

Senhores jurados sou um poeta

um multipétalo uivo um defeito

e ando com uma camisa de vento

ao contrário do esqueleto.

Sou um vestíbulo do impossível um lápis

de armazenado espanto e por fim

com a paciência dos versos

espero viver dentro de mim.

Sou em código o azul de todos

(curtido couro de cicatrizes)

uma avaria cantante

na maquineta dos felizes.

Senhores banqueiros sois a cidade

o vosso enfarte serei

não há cidade sem o parque

do sono que vos roubei.

Senhores professores que pusestes

a prémio minha rara edição

de raptar-me em crianças que salvo

do incêndio da vossa lição.

Senhores tiranos que do baralho

de em pó volverdes sois os reis

sou um poeta jogo-me aos dados

ganho as paisagens que não vereis.

Senhores heróis até aos dentes

puro exercício de ninguém

minha cobardia é esperar-vos

umas estrofes mais além.

Senhores três quatro cinco e sete

que medo vos pôs por ordem?

que pavor fechou o leque

da vossa diferença enquanto homem?

Senhores juízes que não molhais

a pena na tinta da natureza

não apedrejeis meu pássaro

sem que ele cante minha defesa.

Sou um instantâneo das coisas

apanhadas em delito de perdão

a raiz quadrada da flor

que espalmais em apertos de mão.

Sou uma impudência a mesa posta

de um verso onde o possa escrever

Ó subalimentados do sonho!

a poesia é para comer.

Natália Correia

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